Poentes da minha infância
O
sol enrubescia de muita luz e cor
e
preparava vestes de sensual fulgor
para
beijar em festa a serra mais distante.
No
mais fundo dos vales, a noite já caíra.
Sereno
e protector silêncio sucumbira
ao
cansaço do dia, num esforço gigante.
Em seu leito tranquilo, dormia já o rio.
Na vertente do monte, o último assobio
do pegureiro exausto de tanta solidão.
O gado, cabisbaixo, seguia mansamente
caminhos sinuosos em forma de serpente,
chocalhando sinais de vida em união.
Corpos
extenuados arrastavam suor,
sentindo
em pés descalços contactos de amor
por
íntimos caminhos que a casa conduziam.
As
leiras já lavradas exalavam frescuras
de
terras reviradas, espelhos de almas puras
que
por elas lutavam e por elas viviam.
Da robustez dos homens, enxadas companheiras
salvavam os mais velhos, sentados às
soleirasDa robustez dos homens, enxadas companheiras
de quinteiros agrestes com forte aroma a monte.
Treinando seus piões, crianças seminuas.
Cansaço e alegria corriam pelas ruas
onde todas as pedras olhavam para a fonte.
A aldeia fervilhava de azáfama
caseira
e o fumo em que se erguiam novelos da
lareira
cheirava ainda à força de quem era
Mulher:
o caneco sedento, a ceia para os
seus,
o trato aos animais, acreditar que
Deus
lhe destinara a sorte, só tinha que
a viver.
A poça para abrir, canções pelos
caminhos
da água para as regas e a água dos
moinhos,
tudo estava sujeito à mesma lei da
sorte.
No sino da capela, tocavam as
trindades
tangentes badaladas, prenúncio de
saudades
Era assim a tardinha de infâncias já
distantes
nas encostas da serra, onde tempos
marcantes
deixaram a lembrança que me faz
regressar.
Tudo se foi no tempo, hoje nada é
igual…
a não ser as roupagens de fulgor
sensual
4 comentários:
Drª. Aurora
De certeza que a minha Mãe Suzete já tem este seu livro, mesmo assim vou dar-lhe a ler este lindíssimo Poema.
Vai gostar tanto como eu.
Um beijinho grande
Gui
Minha querida Gui
Que saudades eu tenho do vosso carinho!
Se mãe Suzete não tiver o livro "Poentes de mar e serra",onde esse poema saiu pela primeira vez,envie por favor o endereço para o meu mail,que eu envio pelo correio,um dos poucos que tenho ainda.Mas penso que ele saiu também em Imagens da beira-Paiva,onde repus alguns com essa temática.E esse ela tem,de certeza.
Agora dinamizo ao segundo sábado de cada mês,uma TERTÚLIA LITERÁRIA no Hotel Lamego.Depois de amanhã,sobre Sophia de Mello Breyner e Manuel A. Pina.Se quiserem vir,podem ficar em minha casa.Pensem nisso.
Muitos beijinhos para as duas.
Aurora
Excelentes imagens bucólicas em Poesia sentida, da terra e das gentes que a vira nascer.
Viajei prazerosamente nos versos do seu sentir querida Aurora Simões de Matos...inebriada pelos aromas rurais, natureza viva em todo o seu esplendor.
beijinho muito amigo*
Querida Cristina Cebola
O telurismo,tão subjacente ao Poema,faz parte de muita da minha obra escrita.Entendo essa obra como uma missão e o meu empenho tem seguido no sentido de transmitir às gerações vindouras a riqueza das nossas tradições que,sem estes registos escritos ,se perderiam no tempo.
Grata pelo seu carinho e por todo o apoio.
Muitos beijinhos amigos.
Aurora
Enviar um comentário