MEÃ DE SOL-A-SOL
Quem,
dirigindo-se de Castro Daire para oeste, segue pela estrada que, a
par da linha da Paiva, ruma a Alvarenga, encontra, a cerca de vinte
quilómetros da vila e exuberantemente estendida à beira - rio, a
aldeia de Parada de Ester, sede de Freguesia, e logo a seguir Meã,
que administrativamente lhe pertence e que, pouco a pouco, sai da
discreta rusticidade morena que tanto a caracterizava.
Embora
cada vez mais rendida ao fascínio e à comodidade de novos modelos
de habitação que lhe têm vindo a modificar a fisionomia, Meã
possui ainda um aglomerado significativo de casas bem tradicionais,
com paredes de xisto e a típica cobertura de lousa.
Dividida
em dois Povos, o de Baixo e o de Cima, a aldeia espalha-se pelo sopé
da encosta xistosa, bordada por verdes lameiros de pasto permanente,
férteis milheirais e pequenos quintais que, exibindo um leque de
culturas muito diversificadas, emprestam à estrutura da propriedade
parcelada em pequenas explorações agrícolas, uma imagem de
esforçada vitalidade.
Vulnerável,
desde há décadas, à emigração que arrastou esta gente primeiro
para o Brasil, mais tarde para a Alemanha, França e Suíça,
actualmente muito para os grandes centros urbanos de Lisboa, Porto e
Viseu, Meã tem, ainda assim, resistido com grande estoicismo a este
fenómeno e nem por isso a grande área de cultivo deixou de ser
trabalhada.
O
alargamento da escolaridade, que leva às estruturas para a educação
na sede do concelho e escolas superiores a que conseguem ter acesso,
os adolescentes e os jovens cujas famílias escaparam à emigração
é, a par do vai-vem de alguns que à vila se deslocam diariamente
para a sua actividade profissional, outra forte componente nas dificuldades que a escassez de mão-de-obra acarreta aos agricultores.
É
natural que as gerações mais jovens nem sequer cheguem a
familiarizar-se com os nomes dos utensílios da lavoura.
A
enxada, a sachola e o sacho, a gadanha, o forcado e a forquilha, o
ancinho, a seitoira, o pedão e a pedoa, o mangual, a grade, o arado
ou a charrua são termos que mal pertencem ao seu vocabulário.
Todavia, são os instrumentos de trabalho de seus avós e seus pais,
na vida dura duma labuta diária de sol- a -sol. É certo que já há
alguns anos o tractor tomou o lugar do arado e mesmo do carro de bois
que, com altas sebes de vime e sua característica chiadeira pelos
sulcos dos velhos e difíceis caminhos, era um dos mais fortes ex - líbris da vida rural da minha terra. No entanto, a dificuldade na
mecanização da agricultura nas pequenas parcelas de terreno em
socalco, torna pouco eficazes os progressos técnicos e obriga a que
continuem a usar-se alguns dos métodos de há séculos.
O
agricultor trabalha por conta própria, sendo de realçar a
entreajuda como testemunho da tradição comunitária e, embora em
pequena escala, o recurso ao serviço do assalariado rural.
Situados
em excelentes condições naturais de clima, temperatura amena
protegida, humidade abundante, favorável à agricultura e às
pastagens, os campos de Meã produzem essencialmente, a par do milho
que, proveniente das Américas no século XVI, é sem dúvida o rei
das culturas desta região, o feijão e a batata, hortaliças e
legumes, a oliveira e a videira em ramadas (vinhas) ou bardos
(tanchoadas) a demarcarem parcelas de variados tamanhos e declives.
A
poda, a sulfatagem, a vindima, a estruma, a vessada, a rega, a
colheita dos cereais, a malha, a debulha do feijão, a vareja e a
apanha da azeitona são apenas alguns dos trabalhos que o lavrador
enfrenta para, embora sem a pressão de uma economia de subsistência
alicerçada apenas no amanho das terras e há muito ultrapassada,
conseguir não deixar “ ir a monte” aquilo que herdou como
princípio e fim de esforços seculares.
Anexos
à casa de habitação e como suporte ao armazenamento e guarda das
alfaias e das colheitas, são ainda construções de apoio ao
lavrador os palheiros e os canastros. Cada um com seu fim, inventado
para um destino que tem cumprido sem grandes alterações. Quase
sempre ao lado do canastro, como que complementando-o, a eira, espaço
onde rituais da desfolhada do milho e debulha do trigo e do centeio,
a poder de braços e mangual, está longe da azáfama festiva de
outrora.
A
azenha, o alambique e o moinho, engenhos comunitários colocados à
disposição da aldeia pelos herdeiros, a troco das respectivas
maquias, fazem também parte desta impressiva paisagem domesticada
pelo homem que, por muito que dela se afaste, sempre a ela regressa,
fazendo jus ao sentimento - símbolo de uma identidade muito
peculiar das gentes da beira – Paiva.
Aurora Simões de Matos
Nota - Texto escrito com vários regionalismos
Aurora Simões de Matos
Nota - Texto escrito com vários regionalismos
Fotos de Carlos Miguel Batalha
1 comentário:
Minha Bisavó e avó foi nascida e criada em meã e eu tenho grande interesse em saber mais a respeito desta aldeia, infelizmente as duas já faleceram e os registros sobre ela na internet são muito poucos, mas uma feliz coincidência algo me levou a este blog, por favor mais informações de qualquer tipo que seja sobre esta terra por obséquio me informar, serei muito grata ! e-mail: lauralmotta@hotmail.com ou lauralopesmotta@gmail.com , se possível enviar para os dois.
obrigada por sua atenção!
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