segunda-feira, 6 de agosto de 2018

OS HERÓICOS RESISTENTES DO PORTUGAL PROFUNDO


TEXTO de Aurora Simões de Matos

IMAGENS de Portugal Rural by Armando Jorge







OS  RESISTENTES


Não me surpreende a paragem do viajante, de binóculos, esmagado ao gigantismo de uma paisagem dominadora.
Não me surpreende o fervilhar da gente que, nestes dias de férias estivais, coalha os caminhos, as romarias, as feiras, o mercado da vila, os pequenos e os grandes restaurantes à beira das estradas, as partes de rios e ribeiras mais convidativas a uma boa tarde de sol e de lazer.

Não me surpreende a dimensão do amor subjacente aos gestos, atitudes e conceitos unificadores do sentimento colectivo que transforma a vivência social no pulsar de uma cultura que, atravessando todos os sobressaltos, segue o curso que parece dar sentido ao tempo histórico, em permanente interacção entre a fé, a razão e o sonho.




Desde há décadas que o destino de muitos dos pastores e agricultores das extensas encostas do Portugal Profundo  deixou de acompanhar o movimento das estrelas e as fases da lua e de esperar pela chegada cíclica das estações do ano.


A estrutura básica de uma economia matricial de subsistência deixou há muito tempo de satisfazer as suas necessidades e as suas mais que legítimas ambições.

Não me surpreende, pois, a partida dos que, desde há cerca de cem anos até aos nossos dias, num crescendo quase fatal, buscam noutras paragens o amenizar de uma vida quase sempre confrontada com a inevitabilidade de outras dores e de outros suores.

O que me surpreende é o orgulho e a tenacidade dos resistentes, o estoicismo dos que ficaram que, colmatando fracturas bem a descoberto em dolorosos abandonos e em aparatos mais ou menos desarticulados, continuam a perseguir valores ancestrais e conceitos de património, assumidos ao rigor máximo da herança que receberam e que querem, a todo o custo, transmitir incólume.

Num testemunho de coerência verdadeiramente heróica, a força desta gente continua a ser o alicerce singular de uma cultura fiel às suas origens. (…)



                                        ©      Aurora Simões de Matos


2 comentários:

Alexandre Ferreira dos Santos disse...

Muito real e sentido este magnífico texto, os meus parabéns.
Tenho a agradecer a disponilização destas fotografias do Portugal profundo, fotos de uma região onde fui acarinhado durante 15 anos e terra e gente que me marcou de forma muito positiva e deixou uma saudade imensa.
Muitos parabéns por este blog que eu desconhecia e encontrei por acaso, na verdade somos uns resistentes, pois tamb~em eu tenho alguns blogs, um deles um pouco nesta linha, o Consciência Nacional.blogspot.
Desejo-lhe muito sucesso e felicidades,

Alexandre Sarmento

raiz de xisto disse...

Alexandre Sarmento

Muito obrigada pela leitura e apreciação. Deixo um abraço, com votos de saúde e sucesso.

Aurora Simões de Matos