terça-feira, 30 de abril de 2013

AS MAIAS,GIESTAS EM FLOR .....POEMA


AS MAIAS

( COSTUMES DAS BEIRAS )













Já floreiam giestas pelos montes
Aromas acres invadem os caminhos
O amarelo e o branco em horizontes
À mistura com roxos rosmaninhos.

Vamos em bando colhê-las aos braçados
Antes que nasça o sol da madrugada
Com elas marcaremos a morada 
Das nossas gentes e dos nossos gados.

Para que não entrem nelas inimigos
Nem a má sorte de azares ou castigos
Que às vezes caem sobre a natureza.

As maias são prenúncio de farturas
com que a Terra nas suas criaturas
Presenteia o trabalho e a beleza.







                                            Aurora Simões de Matos


domingo, 28 de abril de 2013

VASTIDÃO---POEMA

VASTIDÃO





De todos os cimos se contemplam as estrelas
que as auroras escondem de mansinho
em cada despertar de novas fontes para prodígios de luz
espelhadas em veios de sangue à flor da pele.

De todos os cimos a noite se raia de brisas
balouçando o compasso das sombras nos fraguedos
até se abrir em longos gemidos
na amargura das giestas à flor do vento.

De todos os cimos as nuvens se pressentem 
esquecidas já do mar
filtros de sol castelos dos cabeços
em jogo de escondidas jogo errante
até se perderem de cansaço
na liberdade infindável.

De todos os cimos se estendem horizontes
na vastidão autêntica dos pertos e dos longes
vales e planaltos
o sombrio dos fundos tumulares
e o recorte do céu pousando sobre os montes
encontros e desencontros de distâncias
condenadas ao esmagar das magnas quietudes.


                         Aurora Simões de Matos

quinta-feira, 25 de abril de 2013

DIA DE VESSADA


DIA DE VESSADA







Chega o calor,é tempo de vessada
Dias de alegria e muitas canseiras
Vai o mata-bicho...rompe a madrugada
A festa começa em todas as leiras.

Vão junguir-se as vacas,fieis ajudantes
Não chega uma junta,vem a do vizinho
A Loira,a Pintada e duas Galantes
Fartura ao jantar onde escorre o vinho.

Arado e charrua dormiram na sorte
Com a grade,enxadas,forquilhas,ancinhos
Carro carregado de estrume da corte
Geme em chiadeira,acordam caminhos.

O campo é rasgado por ferro afiado
Que os homens conduzem e as ervas derrubam
As mulheres atrás do labor do arado
Ajeitam os sulcos,enterram,adubam.




A terra está pronta para a sementeira
Do milho,nabiça,botelha,feijão
Cada rego aberto leva uma fieira
O fueiro ajuda o trabalho à mão.

E o cheiro fresco que exala da terra
Adivinha já mil outros labores
Que toda a labuta pela vida encerra
Que hão-de ser canseiras,que hão-de ser louvores.

Já lá vem a noite,é o regresso ao lar
Sacodem-se os pés da terra lavrada
Trabalho acabado...um último olhar
Dia de canseira,dia de vessada...


                                                      Aurora Simões de Matos

Nota: Texto com uso de regionalismos da beira-Paiva





POESIA.....ADORNO

                              ADORNO







                    Borboleta azul que ao meu olhar perpasse,
              vagamente dilui seu ser feito de sol
              nas ondas de uma flor que à morna luz se aqueça.

            A razão é só uma:talvez a brisa
            saiba encontrar ali outra ilusão,
            adorno frágil do meu sentimento.

            No voltear dos sonhos que neste se entrelaçam,
            há sinfonias de vozes sem rosto
            moldadas ao som que corta o sonho ao meio.


Aurora Simões de Matos

quinta-feira, 18 de abril de 2013

S O P E A M...Tertúlia Literária do Hotel Lamego---13/ 04/ 2013

                  VISITA DA SOPEAM

SOCIEDADE PORTUGUESA DE ESCRITORES E ARTISTAS MÉDICOS



TERTÚLIA LITERÁRIA DO HOTEL LAMEGO

(Fundada e dinamizada por Aurora Simões de Matos)


Homenagem aos Escritores e Artistas Médicos







A entrada da SOPEAM na Tertúlia...À frente, com a bandeira da Sociedade, o see Presidente e a Vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Lamego



Aurora Simões de Matos, coordenadora da Tertúlia, dá as boas-vindas à SOPEAM, na foto representada pelo seu Presidente e pela sua Vice-Presidente














António Lobo Antunes


INTERVENÇÃO DE LÍDIA VALADARES



O Texto Que Não Consegui Escrever

Começo por dizer que é para mim um prazer participar nesta homenagem aos Escritores e Artistas Médicos e por agradecer à Sra. Professora Aurora Simões de Matos o convite que me dirigiu. Homenagem merecida, pois muitos têm sido os escritores médicos que têm contribuído para o enriquecimento da nossa literatura e para a sua difusão além-fronteiras.

É, pois, com inefável apreço que trago até aqui o nome de António Lobo Antunes, um gigante da literatura portuguesa contemporânea e de inquestionável destaque a nível mundial. Licenciado em medicina, especializado em psiquiatria, exerceu a sua profissão de médico até 1985, altura em que decidiu dedicar-se inteiramente à escrita.

Escritor controverso, não reunindo consenso no tocante ao apreço do seu arrojado estilo de escrita, parece-me, contudo, incontestável o seu genial contributo na reinvenção de uma nova arte de narrar.

Em «Conversas com António Lobo Antunes», este escritor confessa a María Luisa Blanco:

«O que pretendo é transformar a arte do romance, a história é o menos importante, é um veículo de que me sirvo, o importante é transformar essa arte, e há mil maneiras de o fazer, mas cada um tem de encontrar a sua. A intriga não me interessa, o que queria não é tanto que me lessem mas que vivessem o livro» (Apud Blanco, 2002: 125).

Analisando o percurso literário de António Lobo Antunes, sobressaem, logo nos primeiros livros, algumas técnicas evidenciadoras de um novo rumo que o autor pretende traçar na arte do romance, destacando-se a rutura da linearidade narrativa, a fragmentação do discurso, a austera sobriedade da linguagem, a depuração de uma escrita trabalhada até ao osso e assim despida das «lantejoulas (…) de palhaço rico» (Apud Arnaut, 2008: 215), a indisciplina formal, a confusão de tempos e de vozes narrativas e a valorização do silêncio como elemento fundante do ato de comunicar. Estas técnicas foram progressiva e exaustivamente trabalhadas nos livros seguintes, onde impera o princípio da imprevisibilidade narrativa e um silêncio denso, contudo pregante de significação. As narrativas surgem como uma espécie de caóticos ditados promovidos por uma memória que, em simultâneo, parece dar voz às recordações de tempos e lugares distintos, pela mesma sequência desordenada com que esses lugares e tempos invadem a mente do protagonista, do narrador, da personagem…

Como é evidente, as inusitadas técnicas da escrita antuniana, que subvertem os canônes tradicionais da narrativa, fazem vacilar o leitor que está habituado à comodidade (como aduz Roland Barthes) de «uma prática confortável de leitura» (Barthes, 2009: 138) facultada pelo «texto de prazer» (Ibid.: 138). Todavia, esse princípio da subversão converte-se num princípio gerador de fascínio nos leitores que apreciam um texto de fruição empenhada, aquele que, segundo Roland Barthes, «desconforta […], faz vacilar as bases históricas, culturais, psicológicas do leitor, a consistência dos seus gostos, dos seus valores e das suas recordações, faz entrar em crise a sua relação com a linguagem» (Ibid.: 138), no fundo, aquele texto que desafia. E é esta fruição «in-dizível, inter-dita» (Ibid.: 144) que nos faculta o texto antuniano, onde o não-dito, o silêncio e a indisciplina formal do discurso captam o leitor para dentro do texto, obrigando-o a mergulhar profundamente até «ao fundo avesso da alma» (Antunes, 2007: 113), para poder vir a ter «uma voz entre as vozes do romance» (Ibid.: 114).

Contudo, para que o leitor possa vir a ter uma voz entre as vozes do romance, afigura-se-me de particular relevância a leitura das suas crónicas, tendo em conta a importância de que se revestem para a compreensão da escrita antuniana.

Muitos destes textos apresentam-se como sublimes espaços de metaficcionalidade, de experimentalismo linguístico e temático, de exuberância poética, estabelecendo frequentes diálogos com os romances e detetando-se uma migração de temas, de personagens, de espaços entre os dois géneros. Algumas delas são perfeitos tesouros de elaboração textual, quer pelas reflexões que encerram sobre o modo de escrever do autor, quer pela tonalidade lírica que as matiza ou, ainda, pelo modo privilegiado de dizer e de estruturar o texto.

Por conseguinte, ao invés do autor, que as encara como «textos leves» (Apud Luís, 2008: 498), julgo poder considerá-las como apurados exercícios pré-romanescos, laboriosos alicerces dos seus romances e indubitáveis chaves de leitura dos seus textos. Várias crónicas são utilizadas como campo de reflexão e análise da sua escrita, dos seus métodos de conceção, das suas técnicas de construção textual. Na crónica “O coração do coração” (2002: 45 – 47), o romance perfeito é-nos apresentado como o espelho do leitor, ideia esta que é retomada em “Receita para me lerem” (Antunes, 2007: 113 – 116), onde o livro ideal é considerado como o espelho em que a imagem do leitor e do escritor possam fundir-se numa só, fazendo uma aventura em conjunto ao negrume do inconsciente, à raiz da natureza humana. Nesta última crónica, o escritor manifesta a exigência da participação da voz do leitor entre as vozes do romance, afirmando não existirem nas suas obras sentidos exclusivos nem conclusões definidas. Em “A confissão do trapeiro” (Antunes, 2006: 133 – 135), confessa que o material dos seus romances é composto por aquilo que os outros deitam fora – “despojos, restos, fragmentos, emoções truncadas, sombras baças, inutilidades minúsculas” (Antunes, 2006: 133) – e onde ele descobre “brilhos, cintilações, serventias” (Ibid.:133). E é costurando os textos com estes restos insuspeitados que António Lobo Antunes procura evitar o “Já escrevi isto amanhã” (Antunes, 2011: 93 – 95) e compor livros ou sinfonias que sejam como “uma bela desordem precedida de furor poético” (Antunes, 2007: 137), onde reina a imprevisibilidade na disposição dos restos. A crónica “Explicação aos paisanos” (Antunes, 2006: 169 – 172) reforça esta ideia e reitera a condenação do óbvio “no sentido de uma clareza transparente que não oferece resistência” (Seixo, 2010: 202).

Na esteira do que tem sido exposto, torna-se evidente que a escrita de António Lobo Antunes aposta na rutura da estrutura clássica da narrativa, estilhaçando as categorias que tradicionalmente a sustentavam, dissolvendo o espaço e o tempo cronológico, fragmentando a linearidade da ação e povoando o texto de vozes, silêncios, pensamentos e monólogos que se atropelam. A soberania da voz narrativa é substituída pela intervenção de uma multiplicidade de vozes que se intersetam e que, pelas suas presenças, ausências e suspensões, marcam um ritmo peculiar do texto, tal como acontece com o jogo de presenças e ausências dos instrumentos numa composição musical. Vários são os pontos de contacto que têm sido identificados entre a escrita antuniana e a escrita musical, tendo a legitimidade deste paralelismo crítico sido já confirmada pelo próprio escritor, que tem declarado veemente e repetidamente a influência que a música tem assumido na construção do seu singular estilo de escrever.

A crónica «De Deus como apreciador de Jazz» (Antunes, 2007: 137-139) reveste-se de um valor considerável no tocante à compreensão da narrativa antuniana, uma vez que o autor nos conduz, de forma magistral, ao mundo da música para nos explicar a influência que esta teve na sua escrita e nos aponta o Jazz como um forte indicador da composição e da legibilidade textuais.

Tal como na partitura os sons e os silêncios se entrelaçam, também no texto se verifica a existência relacional entre palavra e silêncio, sendo a sua articulação uma arte que desafia o leitor à sua interpretação e se a «música, ou arte das Musas, pode ser definida como a arte de combinar sons sobre uma tela de silêncio, a partir de regras variáveis de acordo com o lugar e a época» (Smedt, 2006: 69), também a escrita de Lobo Antunes pode ser entendida como uma combinação de palavras sobre uma tela de silêncio tecida numa retórica da supressão, da elipse e da rutura sintática. Existe, assim, no texto uma espécie de velatura que se apoia no silêncio, no não-dito e no discurso imprevisivelmente interrompido, sobressaindo dessa mesma velatura a ausência de um travejamento diegético mitigada pela convocação do leitor, a fim de que este possa ressuscitar o sentido que o narrador eclipsou do texto.

Retomando a analogia com o Jazz, assim como Charlie Parker, Lester Young e Ben Webster introduziram marcantes alterações no mundo da música (do Jazz, em particular), também Lobo Antunes rompeu com o ritmo previsível das narrativas, jogando com as entradas da palavra e do silêncio em tempos insuspeitados. Está subjacente à obra antuniana a ideia de surpreender, de chocar, de captar a concentração do leitor, sugando-o para o interior do texto. Tal como o Jazz é marcado pela imprevisibilidade dos sons, em termos de presença/ausência, intensidade e ritmo, também na escrita de Lobo Antunes é possível encontrar processos muito próximos da construção desse tipo de música. Podemos, assim, dizer que estamos perante uma técnica de construção textual inovadora e que exige um engenho apuradíssimo para evitar o desmoronamento de todo o «edifício» verbal, competindo ao leitor, cúmplice desse trabalho de engenharia textual, colaborar na tarefa de dar sentido às lacunas, às pausas e aos cortes discursivos.

Espera-se, então, que o leitor, em estreito dialogismo com o texto, reaja ao desafio da (des)ambiguidade interpretativa que lhe é proposto, investigue a identidade das falas, organize os fragmentos desordenados, una os fios narrativos soltos e preencha os vazios ou escreva nos silêncios, pois, como afirma Lobo Antunes a Luísa Jeremias, «ler é escrever. E quando estamos a ler um livro também o estamos a escrever» (Apud Jeremias, 2008: 377). Destaca-se, assim, o papel de relevo atribuído à interação entre o leitor e o texto, revelando o construto textual, na linha da Théorie de l’effet esthétique de Wolfang Iser (1976), mais ênfase no efeito que a obra pretende provocar no leitor do que na transmissão da intenção autoral, visando-se, pois, um sentido multívoco para o texto literário. Deste modo, parece-nos que a busca incessante do silêncio na narrativa antuniana ambiciona o papel ativo do leitor face ao texto, exigindo um leitor participativo. Neste sentido, a escrita antuniana, repleta de implícitos e de silêncios, afigura-se-nos um apelo constante à reescrita do leitor, pois como Pierre Van Den Heuvel sustenta, «la parole de l’implicite est toujours un silence, le plus souvent volontaire, par lequel le locuteur fait appel à la faculté de déduction chez son interlocuteur» (Heuvel, 1985: 93).

E, neste momento, assalta-me o pensamento  “A crónica que não consegui escrever” (Antunes, 2007: 107 – 111) de Lobo Antunes, pela similitude da situação em que me encontro. Tal como o autor, que a inicia com o desabafo “Estou há meia hora aqui sentado à espera que me venham as palavras para esta crónica e nada. De que vou falar?”, também eu, ao iniciar este texto pensava: “De que vou falar?” É que falar de António Lobo Antunes em tão curto espaço de tempo é quase uma tarefa impossível, uma utopia. E, chegada ao fim, reconheço que não, não consegui falar de Lobo Antunes. Portanto, finalizo este texto parafraseando a referida crónica, assumindo que este foi “O texto que não consegui escrever”.



     Resta-me esperar que as notas soltas que aqui deixo possam, de algum modo, contribuir para seguirmos os conselhos de António Lobo Antunes, não lendo os seus livros, mas intentando vivê-los, vendo as nossas sombras nos espelhos das suas páginas e sendo uma voz entre as vozes dos seus romances

.


Lídia Valadares

Hotel Lamego, 13 de Abril de 2013











Lídia Valadares
(Estudiosa de Lobo Antunes)  

terça-feira, 16 de abril de 2013

HOMENAGEM ÀS COSTUREIRAS - Poema de Aurora Simões de Matos

         

                         À MINHA COSTUREIRA 

                                            D.ILDA

       E ÀS LINDAS ROUPINHAS COM QUE VESTIU 

                            A MINHA INFÂNCIA





Tive um dia um vestidinho
andava pelos sete anos
de que guardo a memória 
e que tem a sua história

Todo de piqué branquinho
tecido picotadinho
era cortado na cinta
com dois bolsinhos à frente
e atrás um laçarote

A rematar o decote
a gola em bico cortada
era toda debruada
a pontinho de recorte





A saia muito rodada
era forrada a saiote
que levava uma espiguilha
e ficava à maravilha
naquela saiinha armada
com dois lindos coelhinhos 
bordados nos dois bolsinhos

D. Ilda mo cortou, alinhavou e provou
D. Ilda mo coseu, chuleou e caseou
e mo bordou.

Entre a larga vizinhança 
corria certo boato
que agradava a minha mãe

que D. Ilda esmerava 
quando pra mim trabalhava 
e pra minha irmã também



Era falso esse boato 
que pela aldeia corria

O que afinal se passava 
era a bela sintonia
que existia
entre a boa D. Ilda a costurar
a minha criada Hortênsia a lavar
minha mãe que se esmerava a engomar
e a modelo que era eu...que bem vestia!...



                                                                                      Aurora Simões de Matos

Do livro  POENTES DE MAR E SERRA --- 1997

quinta-feira, 11 de abril de 2013

A ALFAIATARIA

           A ALFAIATARIA
         em meados do século xx 

                         



                 

Na grande sala, impunha-se enorme mesa comprida de madeira de castanho, onde se estendiam e cortavam os tecidos e onde se amontoavam, a um dos topos, panos de vários padrões, grossuras e texturas. Mas também réguas, moldes, paus de giz envernizado, almofadas com agulhas e alfinetes, caixas com carrinhos de linha (de máquina e de alinhavo), botões, molas e colchetes,tesouras de vários tamanhos, papel vegetal, chumaços, forros e entretelas.E o ferro de engomar, a brasas.




***





Os figurinos de Paris ocupavam lugar de destaque, na mesinha a um canto,  ladeada por algumas cadeiras e ao lado de coluna com o ramalhudo vaso da begónia.

Fazendo jus ao inventor que lhe emprestara o nome, a  máquina Singer era rainha na sala. Como rainha poderia ser uma Oliva ou uma Husqvarna. Sempre muito ocupada, com a cabeça cheia de pormenores de complicado enfiamento, apenas sujeita a ligeiro auxílio de mão na roda e pé no pedal.
De vez em quando, precisava que lhe oleassem a correia e a cabeça,  através de diversos orifícios, com a ajuda do bico afiado do pequeno oleador de folha. Só assim ficaria mais leve e solta para o trabalho exigente do dia a dia.

Enfiar uma máquina de costura não seria para qualquer um. Era preciso jeito, sensibilidade e prática. Para que a linha do carrinho espetado no cimo da cabeça e a linha enrolada à volta da lançadeira colocada em pequeno invólucro cilíndrico, no interior da mesa ao alcance da agulha, corressem com facilidade para, prendendo-se uma na outra ao longo de cada costura, dela fossem o direito e o seu avesso.

(......)

Aurora Simões de Matos

No livro CONTOS DE XISTO ---- 2012











sexta-feira, 5 de abril de 2013

APELOS DA PRIMAVERA



                                        PRIMAVERA

                                            APELOS



Já o chão se enfeitou de presentes.
Se souberes escutar,
ouvirás o arbusto a gargalhar de verde,
o brilho das estrelas 
coado na limpidez das águas.

Tal qual a criança que,frágil,
se abalança entre passos de gozo,
aprende a esquecer a velha condição
da natureza morta
e parte à descoberta de alianças de vida.

Já o ar se encheu de secretos apelos.
Se souberes escutar,
ouvirás na lonjura a dimensão de um sonho,
segredo guardado a desabafar
o zumbido urgente de uma esperança nova.

À boca do peito,encosta as mãos em cruz
e esculpe o modelo do amor que renasce...


Aurora Simões de Matos

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Primavera-Renovação



PRIMAVERA.........RENOVAÇÃO









A condição humana aveludou-lhe a pele de sonho
perfumou-lhe a seiva
cobriu-a de versos cor-de-rosa.
E cantou-a.

Até onde pôde coroou-lhe de espanto cada olhar
urdiu-lhe teias de enxoval de linho
estendeu-lhe caminhos virgens.
E amou-a.

À hora de lhe largar a mão
abençoou de claridades cada imagem daquele rosto
e transformou em mito cada tom do verde fértil
que lhe deu nome à raiz.
E lançou-a.

Dos Olimpos aonde a dirigiu
chegaram-lhe hinos de triunfo e soltaram-se os louros da vitória.
E orgulhou-se.

Seu sonho verdadeiro cresceu
como a semente que ao ano se renova
como a surpresa que à Vida se refaz...




                                         Aurora Simões de Matos