sexta-feira, 1 de novembro de 2013

BRUXAS E ASSOMBRAÇÕES

BRUXAS E ASSOMBRAÇÕES
(neste Dia das Bruxas de 2013)



(...)

Estamos,portanto, perante uma sábia figura feminina de grande calibre psicilógico, coragem, boa vontade, espírito disponível e solidário. E também de uma boa disposição contagiante.

 Não admira, pois, que, quando pensei escrever sobre o fantástico das assombrações, espíritos, almas penadas e bruxas à solta na nossa terra, tivesse contactado a minha amiga Maria para me contar, como só ela sabe, algumas das historietas que por lá se ouvem meio entre-dentes, um tantinho a brincar, um tantinho a sério.

Ao telefone, tivemos uma conversa inesquecível, que me deu conta de que, segundo ela, não há fonte, barroco ou ribeiro, onde os espíritos das águas não tentem interferir com a vida dos que por cá continuam.



- Lembra-se, sra. professora, do ribeiro da Valtijosa? Pois aí, uma noite, o Revolta viu um gato preto e teve de se desviar.
- Coitadinho do gato! Ó Maria, não seria ele de algum vizinho e não andaria perdido por ali?
- Não senhora, aquilo era o diabo!- sentenciou, sem me dar azo a argumentos.

- E no alambique da fonte? A gente metia-se lá dentro a fazer a aguardente de noite e não se podia abrir a porta a ninguém. Ele batia, batia, mas ninguém abria...
- Ó Maria, não seria alguém que passava no caminho e queria meter conversa?
- Não senhora, aquilo era o diabo! - sentenciou, sem me dar azo a argumentos.



- E quando eu morava lá em cima, à beira da estrada? Uma vez de noite, estava com o meu homem à janela e ouvimos uma orquestra. Pensámos que era a música de algum baile. Mas não era, porque a orquestra foi-se afastando. E houve uma altura em que se ouviu um barulho tão grande, mas tão grande, que parecia que deitava tudo abaixo. De manhã fui ao campo da Silveira ver o que se tinha passado...e estava tudo na mesma.
- Ó Maria, não teria sido alguma camioneta de carga que passou na estrada, levando a música em alto som... e que se foi afastando...?
- Não senhora, aquilo era o diabo! sentenciou, sem me dar azo a argumentos.



- E quando eu morava perto da fonte? Uma noite, uma mulher que eu bem conheci em vida, bateu-me à porta e pediu-me que fosse ao S. Macário levar uma oferta, pois tinha morrido sem cumprir aquela promessa. Respondi que fosse ter com a família dela, com mais posses que eu. Mas ela não falou com ninguém da família. Procurou antes a R...do Povo de Cima, que a senhora deve conhecer. E essa então é que foi ao S. Macário levar uma menina de cera, para a defunta poder descansar em paz...
- Ó Maria, isso não terá sido um sonho seu???
- Não senhora, aquilo era uma alma penada! - sentenciou, sem me dar azo a argumentos.



- Ó sra. professora, e uma vez no moinho do Avelal? Era de noite e eu estava a moer o milho com o meu pai. Nisto, sentimos alguém que nos apalpou e saiu pela porta fora.
- São as bruxas!- disse o meu pai, em voz baixa. Vamos espreitar pelo janelo...
E sabe o que vimos? Estavam três no ribeiro a lavatearem-se. Mas eu bem as conheci. Eram a G...., a B... e a T..., sim senhora, que eu bem as vi!!! E no fim foram-se embora em fila pelo carreiro, cada uma com sua lanterna.
- E quando elas vos apalparam, o que traziam vestido?- perguntei divertida.
-Ah...isso não vimos, porque estávamos de olhos fechados, cheiinhos de sono...
- Ó Maria, não seriam pessoas que andassem a regar de noite e fossem ao ribeiro virar a água ou mesmo lavarem-se?
- Não senhora, aquilo eram as bruxas! - sentenciou, sem me dar azo a argumentos.


Foi uma conversa saborosíssima. Eu pasmei com a ingenuidade da Maria. Ela pasmou com a minha ingenuidade.
E afinal, quem sou eu, para duvidar das certezas de uma amiga???


                                     Aurora Simões de Matos




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