sábado, 6 de outubro de 2012

Janela de Outono

JANELA DE OUTONO










     O peitoril desta janela outonal de onde preguiçosamente me debruço, para agarrar uma ou outra das mil folhas dispersas que perante meus olhos se desdobram e multiplicam em páginas que se perseguem e me perseguem, é o ponto privilegiado do patamar a que consegui chegar Mais por mercê da inexorabilidade do tempo do que por força da legitimidade das minhas ambições.
     Não trocava por nada do mundo este peitoril de janela outonal. Ele confunde-se e confunde-me no tempo. Ele é o próprio tempo.
     Daqui permito-me visões parcelares interpretativas de visões globais sobre primaveras e verões pretéritos, numa fantástica ubiquidade que só eu entendo. Porque essas primaveras e esses verões foram e continuam a ser minha pertença exclusiva e neles me posiciono ao sabor da relação que mantenho com o meu passado. Que me não é tão difuso que não permita, embora com algumas, muito raras desfocagens, fazer leituras conclusivas.

     São leituras de folhas soltas, de páginas de vida do espólio guardado pelo tempo contado em anos, dias ou minutos. É a explosão dos cheiros, sabores, musicalidades e sobretudo da cor que já não fere, da luz que já não cega, da abundância que já não repugna a saciedade. E é também a explosão dos silêncios, pela força dos silêncios.
     Apetece calmamente rebuscar no sótão das minhas recordações as prendas que quis guardar e resguardar, concedendo-lhes o valor da perpetuidade.
     Sem desviar os olhos dos momentos estilhaçados pelos meus fracassos, detenho-me orgulhosa no reviver sereno dos meus êxitos. Cada flor que plantei ou cada fruto que gerei têm a marca inconfundível do amor e da verdade com que os criei e são, hoje e sempre, os meus pontos de ancoragem.
     Sinto-me bem nesta melancolia colorida de Outono que assumo como aquele estado de graça em que, numa predisposição lógica e natural para a revisão sentimental(ista) dos meus sonhos, percepciono pequenas e grandes respostas a pequenas e grandes perguntas, com a lucidez que ultrapassa e apaga quase todas as dúvidas. Até porque o acumular e o desmoronar de tantas das minhas ilusões e desilusões se transformaram naquela incomensurável mais-valia que quase me garante a imunidade ao risco.
     Debruçada desta minha janela escancarada sobre a VIDA, repousando o olhar sobre um grande postal ilustrado de cores sóbrias, sorrio à vaga expectativa que me sugere a infinitude de horizontes que daqui vislumbro.
     Porque o OUTONO é também a estação da POESIA.
                                                                                                                         Aurora Simões de Matos


6 comentários:

Anónimo disse...

Uma janela aberta às estações do ano perfuma toda a página de calmaria. Um encontro e um retorno ao ciclo vital da vida, ao húmus que alimenta a Raiz (do Xisto), na serenidade, e no saber, de saborear o tempo de todas as estações no exercício de sua arte. O que fica é a magia do movimento lento das folhas que se deixam ser levadas pelo vento: Poesia.

Grata pelo perfume e um beijinho Aurora.

Marília B. B.

raiz de xisto disse...

Queridíssima Marília

Muito bonito ver-te aqui,onde partilho as minhas emoções com GENTE que me lê,a partir dos mais diversos cantos do mundo.GENTE que me procura sem me conhecer pessoalmente.Apenas porque se identificam com as minhas mensagens.Penso...
Adorei o teu comentário,como adoro toda a palavra que sai da tua mão,do teu coração,da tua voz que nunca ouvi,doce Marília!
Um beijo com todo o meu carinho.Sabor a sol morno,desta janela outonal onde te pressinto POESIA...
Até sempre,Amiga das asas brancas,cor da lenda...

Aurora

vida entre margens disse...

Querida Aurora!

E desse peitoril de onde observa os caminhos percorridos, consegue vislumbrar trilhos ladeados de rosas, ainda por percorrer. Com a magia da poesia e com toda a sabedoria dos aromas da terra...

Beijinho com carinho e gratidão pelo privilégio de poder lê-la :*

raiz de xisto disse...

Minha Amiga Cristina

São trilhos percorridos com a verdade de uma Vida cheia de TUDO.
Que os seus caminhos,Cristina,continuem a conduzi-la por paisagens cheias de sol,rumo ao infinito do seu SONHO...E se alguma nuvem toldar o céu do seu espaço,olhe para trás e deslumbre-se com a beleza da SEARA que semeou.Aí encontrará o impulso para o resto da viagem...

Beijinho amigo

Aurora

vida entre margens disse...

Palavras sábias e cheias de magia!
Muito grata querida Aurora Simões de Matos, por poder partilhar deste seu canto, onde me encanto...

O meu beijinho muito amigo...***

raiz de xisto disse...

Amiga Ctistina

Mágica é essa capacidade de comunicação, através de afetos tão sinceros.Por eles,o meu sorriso e o meu beijo.

Aurora